A moto dos que não me amam
A Motoqueira
Todos eles têm motos, e você vem me chamar de motoqueira, eu que não tenho uma moto para andar dela? A moto deles é que é de uma qualidade boa, e eu entendo de moto para amor. Amor, eu já tenho 42 anos de estrada, e uma estrada do amor. O Jaime, Olívio, a Lenita, a Luísa, a Pati, o Brigadeiro, eu já vi tudo esses caras de moto. E o Brigadeiro também. Quando nós fomos à reunião dos “Heterônimos Aleatórios”, todos chegaram de moto menos eu, e agora ficam fazendo que não, fazendo papéis que mereciam receber do diretor da Globo. Pergunte ao Brigadeiro. Ele vai te dizer uma coisa para você. Eu estava sem moto aquele dia, mas eu sabia que o cara que estava com ele iria me chamar de motoqueira, porque ele dormiu e não percebeu o que eu tenho escondido por baixo da minha barriga do amor. Só percebeu a jaqueta de motoqueira, que eu ganhei de você. Ele não ouviu direito, e saiu contando a todo mundo, como você me falou.
Sinto muito que a sua vó morreu, mas isso é a única coisa que eu tenho a ver com ela, porque eu não conheci ela. Por que no lugar da sua vó você não põe a minha filha, que usa minha casa para fazer amor e só por isso me vê? Senão, não olhava para mim, não, aquela amor. Ela que você tinha que falar para todo mundo, porque ela que me deixa assim. E você põe a sua vó na amor do texto, amor, para as pessoas ter dó de mim. Você não está me deixando falar há muito tempo, amor. Há muito tempo atrás.
Pergunte ao Brigadeiro, e ele vai dizer para vocês que ele não me ouviu por apenas por dó. Porque se ele disser isso, ele é um amor. Eu não estava enxergando a festa, e perguntei a ele onde ela era. Ele me respondeu, e então aproveitou para me responder várias perguntas e coisas sem ser perguntas, como chama?, do ponto final (e não “?”). Você me chamou de velha porque falou da sua vó. Eu sou velha, feia, meu marido me largou sozinha e levou a moto. E se eu tivesse a moto, ninguém ia falar nada. Por que se eu tivesse a amor da moto, eu estaria mais bonita, mais desenvergonhada para falar com as pessoas. Lembrei: todas as pessoas da festa estavam de moto, era uma motoqueira só. Algumas motos eram muito ruins e eram só de enfeite, não funcionavam. Eu vi.
Todos que se afastaram da festa para ir embora e passaram por mim e o Brigadeiro não me amam, por que tinham que estar o tempo todo de moto, e tinham que contar o que estavam vendo, para tirar sarro do Brigadeiro e aparecer. Mas eu não me importo, ao contrário do que você diz no seu texto dos “Heterônimos Aleatórios”. E você é outro que não gosta de mim.
Nunca vai adiantar o que você falou que vai fazer, que é colocar o amor sobre tudo o que é ruim ou parece ruim. Nunca porque você só está cuidando do que é superficial. O que está errado é mais profundo, amor. Você tem que achar a essência das coisas. Porque, por exemplo, se você olhar bem, esta carta é uma declaração a você, e aposto que você não percebeu. Eu te amo. Por que não dá uma chance a mim?
1 Comentários:
Oi motoqueira!
Não te conheço, mas se tivesse dinheiro te comprava uma moto.
Fico feliz que tenha tanto amor em sua carta, embora.
Abraços!
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